A_ Apresentação do problema
A queda da cobertura da nave, da igreja, durante o
nefasto terramoto de 1755, veio transformar para sempre, e de forma profunda a
espacialidade interior da igreja. A nave
que era um espaço interior e fechado ao
mundo como é normal e comum, torna-se assim num espaço exterior tipo pátio/adro
da capela mor. Transição entre o profano e o sagrado.
Ao contrário do que aconteceu com diversas igrejas
que sofreram o mesmo tipo de danos no terramoto, a nave da igreja de S. Tiago nunca
chegou a ser reedificada. Deste modo,
ficou para sempre como uma nave aberta aos céus e resguardada do mundo; nunca
perdendo realmente a sua verdadeira identidade espacial enquanto espaço de ligação
entre o Homem e Deus.
Com o passar dos anos e,
das gerações, os homens foram dessacralizando o espaço, perdendo o mesmo parte do cariz de nave e tornando-se mais num adro descuidado e descaracterizado da
capela de S. Tiago.
C_ Potencialidades do lugar.
O
espaço da antiga nave coberta pelo humano, deu lugar a um espaço aberto ao
firmamento pela força brutal da natureza.
A
força natural originou um espaço profundo e propicio para a reflexão e o
encontro do Homem consigo e com o divino na oração, como os antigos claustros
isolado e protegido do profano ao mesmo tempo que é aberto aos céus da criação.
Mais
do que um adro da capela, acredito que este espaço é e será sempre verdadeiramente
a nave da igreja de Santiago, e será essa a essência a recuperar e revelar na
hora de pavimentar o espaço.
A estratégia a optar na hora de pavimentar este espaço deveria desde logo ter em
atenção
1-A intervenção deveria respeitar
e valorizar o edifício histórico da capela de forma a ser uma mais valias para
o mesmo e não o contrário.
2-Deveria ser uma intervenção
com uma linguagem contemporânea mas integrada no conjunto seguindo os preceitos
recomendados pelas diversas cartas do património( Atenas 60; Bruxelas; …)de forma que o licenciamento
da obra e sobretudo a valorização e dignificação do património seja conseguido;
não levantando questões sobre a identidade e época da intervenção.
3-A proposta deveria ter como
premissa fundamental a ré-sacralização do lugar tendo em conta o cariz sagrado
de todo o edifício.
4-Seria necessário ter em
conta a manutenção futura do espaço e de a mesma ser simples
e pouco necessária ao longo do ano.
5-A formas ornamentais a
introduzir no pavimento deveriam ser simples de fácil e rápida execução tendo
em conta a economia da obra futura.
...
D_ Intervenção proposta.
Tendo
em conta as premissas anteriormente enunciadas a primeira ideia que surgiu foi
marcar o pavimento com um símbolo sagrado de fácil compreensão, para qualquer
ser humano, mais ou menos culto.
A
Cruz símbolo e marca por excelência do Cristão; foi o signo desde logo escolhido
para a marcação espacial. Como é uma igreja dedicada ao apóstolo Santiago a
cruz inicialmente escolhida foi a cruz de Santiago.
Como
um das premissas fundamentais era a o
utilização de formas simples e de fácil execução. Foi assim decidido
“purificar” a forma da cruz original de Santiago, para uma forma mais pura e
geométrica da cruz.
Para
a execução / criação da forma geométrica foram utilizadas relações geométricas
tradicionais e frequentes na arquitectura religiosa católica medieval. Deste
modo a cruz foi construída através da relação de 12 círculos entre si. Simbolizando
cada circulo um apóstolo e por continuidade apostólica a igreja enquanto
comunidade de fiéis.
Após
ter sido encontrada a forma da cruz, foi decidido propor que a cruz fosse
realizada com lajetas de mármore serrado ou amaciado em vez de em calçada.
Isto
porque a calçada é um tipo de pavimento normalmente associado a passeios
públicos ou espaços de uso comum e profano, para “sacralizar” e marcar o
espaço, julga-se ser apropriado, utilizar um material mais cuidado e nobre...
esquiço /estudo (@ Jorge Ganito)
...
A
estratégia escolhida passou por aumentar ligeiramente a área da actual zona
pavimentada e impermeabilizada com a betonilha, tornando-a num espaço mais
confortável em termos dimensionais e ao mesmo tempo mais interessante em termos
de materialidade. Sendo proposto para a maior parte da área a utilização da
calçada tradicional da região em pedra mármore, sendo excepção a cruz central
em lajetas de pedra mármore de acordo com a descrição feita anteriormente.
Nas
laterais da zona pavimentada é sugerida a colocação de duas caleiras feitas com
lajetas de mármore branco(15cm
de largura por 30 de comprimento a 3 de espessura podendo levar um furo 2cm no
centro )que
sejam separadas entre si cerca de 2 a 2,5cm de forma a permitir a entrada da
água. No fundo do adro junto aos bancos é proposto uma outra caleira de reunião
de águas que por sua vez terá ligação subterrânea com as águas pluviais
públicas. (Para
se perceber o funcionamento do escoamento das águas deve-se ver o desenho nº10)
Na
lateral é proposta a criação de um espaço permeável onde seja inserida alguma
vida vegetal entre as 12 lajetas de pedra mármore branco simbolizando cada uma
delas um apóstolo. Para reforçar o simbolismo das lajetas é sugerido que seja
gravado em cada uma delas uma frase do evangelho. O espaço permeável entre as
lajetas inicialmente pensado seria relva, e entre as distintas peças poderia
ser plantada uma roseira ou uma videira. Como a relva exige alguma manutenção e
para não se correr o risco de aquele espaço ficar como terra árida sem
tratamento, sugere-se a colocação de uma fina camada de brita miúda (diâmetro 20 ou 30mm) de mármore lavada sobre a
terra; sendo possível e aconselhável fazer a plantação de roseiras e videiras.
esquiço do autor e excerto da memória descritiva do projecto
Desenhos, projecto e Fotografias da obra concluída
de Jorge Ganito
( o texto e imagens deste artigo possuem direitos de autor Jorge Ganito@2013)
Nota final:
O principal motor e a ideia desta obra foi da Confraria da Santíssima Trindade de Vila Viçosa que conjuntamente com a paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, tendo a obra sido realizada também graças ao apoio das identidades públicas locais nomeadamente da junta de freguesia.
Informações complementares em jganitoarquitecto.blogspot.pt